Deviam-me ter dito que carrego em mim um coração diferente
de outros tantos, também eles distintos entre si. Aconselhar-me que sentir, só
com cautela, e viver, só com a ideia de que o fim das coisas boas chega assim
que aterramos naquela cama aconchegada, na relva fresca do verão, no sofá ao
fim do dia… Sempre nos disseram para falarmos ao mundo, mas nunca nos avisaram
o quão importante é ouvir o mundo, e ele tem tanto mais para nos dizer.
Enganaram todos com a ideia de que a solidão é um existir no
espectro negativo e obscuro, quando na verdade é apenas uma das demais condições
humanas. Ser só, é ser. E agora que a as sementes já não germinam, a água já não
sacia a sede, e a chuva já não molha, eu só quero ser.
Ele ainda me mandou mensagem numa tarde qualquer onde me
pediu desculpa. Mas as pessoas não sabem encarar a desilusão e a dor que é
errar. O pedido de desculpa foi a última conjunção de palavras que dele recebi.
Depois de desiludir alguém, nunca ninguém procura o perdoo, procura é a
liberdade relativa às grades que o sentimento de culpa constrói. E foge.
Muitas
vezes vemos pessoas de costas para nós, a caminhar em direções tão distintas às
nossas, a vociferar palavrões numa linguística que mais ninguém consegue
compreender, numa fuga constante ao medo, à dor, à mudança, à verdade, ao defeito,
mas que na realidade procuram o mesmo que todos nós.
Provavelmente vou encontrando, algures por aí, toda esta
gente que partiu. Numa rua, num bar, no cinema… Mas por favor, da próxima vez, digam-me que o licor doce tem um travo amargo passado umas horas, que caminhar
quilómetros me vai causar dor nas pernas, que o chocolate dá borbulhas, que o
caos leva à mudança, que dormir demais aleija na cabeça, que acordado é que
devemos sonhar, que a consensualidade cansa, que ser é diferente de existir, que
o conforto demais desconforta, que o amor dói.
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