Quando se vive só, não se fala muito alto, não se escreve
também muito alto: receia-se o eco, o vazio do eco. Damos de caras com o
silêncio, ele observa-nos com um olhar penetrante como se nos quisesse engolir
para lugar nenhum. Com ele vem este perfume a coisa nenhuma que é mais intenso
que jasmim ou plantas herbáceas banhadas em álcool. Invade abusivamente
qualquer espaço, e faz-nos querer calar o grito de socorro, para não o
incomodar. No gélido isolamento, o silêncio, promoveu-se de antagonista para o
sublime herói que admiro e quero ao meu lado. Acomodou-se a mim. Ou eu a ele.
Acreditava que tínhamos o dom da mutabilidade, tanto nos
adaptávamos ao frio da Islândia, como ao calor da Tanzânia, a um quarto numa
cidade grande ou uma casa numa vila campestre, à solidão de uma cama vazia e ao
aconchego de um corpo que adormece a nossa lado, ao prazer de atravessar as
fronteiras da sexualidade com uma voz que nos deseje ou até mesmo fazê-lo
sozinhos sem voz nenhuma, tanto sorrirmos acompanhados ou a sós, a sentirem-nos
ou sentirmo-nos… Contudo, “em última análise, precisamos de amor para não
adoecer”, e desta vez o mais importante está em falta, não te tenho a ti.
A única maneira de curarmos a doença é sermos humanos a
deixar de ser humanos, é termos amor na despedida, silêncio no eterno exílio, é
não beijarmos quem mais queremos beijar, e não tocarmos em quem mais precisa de
ser tocado. A cura é sabermos como chegar ao coração do outro sem nos
aproximarmos dele. Está em encarar a individualidade como o único mecanismo de
preservar a humanidade. Quão longe está a cura do medo.?.?. e quando isto tudo
terminar, quão perto estará o medo para nos impedir de novo a ser humanos? Abraçar
um corpo gélido, acarinhar uma face magoada, sussurrar ao ouvido “amo-te”,
deixar os lábios húmidos encostarem-se a uma pele ferida ou simplesmente dar a
mão? Sem inquietação.
Porque se hoje são os pesadelos que me inquietam, que me
fazem alucinar com cada face vossa e a estar cada vez mais longe de vos ter…
Amanhã vou acordar e ver que tudo é verdade. Estou pálido, como se o desgosto
me bebesse o sangue. O cabelo deixou de me crescer como se até ele tivesse
parado. Duvido da coerência da minha visão, da veracidade do meu toque, da
autenticidade do meu paladar, e empoleirado nesta corda bamba, entre o pesadelo
alucinogéno e a realidade… Perdi-me. Ou então encontrei-me, na forma mais
bruta e selvagem do meu “eu”.
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